Caso a economia global caia em uma depressão profunda, empresas
americanas que abraçaram um modelo de produção flexível, como a
fabricante de motocicletas Harley-Davidson Inc., correm menos risco de
serem arrastadas para o buraco.
Até recentemente, a enorme fábrica da Harley aqui praticamente não
tinha nenhuma automação, e mais parecia um museu industrial. Agora, a
produção, que antes se espalhava entre 41 prédios, está consolidada em
um único galpão iluminado, onde robôs fazem o trabalho mais pesado. O
total de empregados contratados, cerca de 1.000, representa a metade do
nível de três anos atrás, e mais de 100 deles são funcionários
"casuais", vêm e vão quando necessário.
A reformulação permitiu à Harley, que tem sede em Milwaukee, no Estado
de Wisconsin, aumentar ou reduzir rapidamente a produção em resposta às
mudanças de demanda. "Esta é uma transformação gigantesca", diz Ed
Magee, gerente da fábrica, que é um dos três centros de produção da
Harley nos Estados Unidos.
Os ganhos de eficiência implicam que a Harley deve conseguir elevar sua
margem de lucro operacional para o negócio de motos (excluindo
operações de financiamento) para quase 16% este ano, comparado com 12,5%
em 2009, diz Craig Kennison, analista da Robert W. Baird & Co., em
Chicago. A Harley já não precisa de picos de produção para obter grandes
lucros, diz ele.
É comum empresas dizerem que aprenderam as lições do passado e depois
serem pegas no contrapé quando a economia muda. Mas, no geral, os
fabricantes americanos estão em melhor forma depois de enxugar suas
operações e repensar práticas ineficientes durante a brutal recessão de
2008/09. No primeiro trimestre deste ano, o lucro total das empresas de
manufatura do país alcançou uma taxa anualizada de US$ 363 bilhões, bem
acima dos US$ 290 bilhões de cinco anos atrás, segundo o governo.
Assim como a Harley e outras empresas, a Caterpillar Inc., fabricante
de maquinário para a construção, agora depende mais de trabalhadores
"flexíveis", incluindo funcionários temporários e terceirizados. A
Caterpillar, em geral, não tem que pagar indenizações quando dispensa
esses trabalhadores nos períodos de pouco movimento. Trabalhadores
flexíveis representavam cerca de 16% de sua força de trabalho global em
30 de junho, ante 11% no fim de 2009, quando muitos desses empregados
foram cortados por causa da queda na demanda.
A Harley adotou com mais seriedade a estratégia de cortar custos quando
Keith Wandell tornou-se diretor-presidente em 2009, em meio a uma queda
severa nas vendas de motos. Em sua primeira visita à fábrica de York,
recorda Magee, Wandell declarou que o desenho e os métodos de trabalho
da fábrica eram insustentáveis. A empresa notificou a Associação
Internacional de Maquinistas e Trabalhadores Aeroespaciais, ou IAM,
sindicato que representa os empregados de York, que planejava fechar a
fábrica e transferi-la para outro Estado, a menos que eles aprovassem um
novo contrato dando à Harley mais controle sobre os custos. Os membros
do sindicato votaram esmagadoramente pelas concessões, e a Harley ficou
em York.
Em vez de 62 tipos diferentes de cargos, a fábrica agora tem cinco, ou
seja, os trabalhadores têm uma variedade mais ampla de habilidades e
podem ir para onde sejam necessários.
Kim Ávila, que trabalha na fábrica de York há mais de 17 anos, diz
acreditar que as concessões eram a única chance de preservar os
empregos. Hoje, o ritmo de trabalho é mais rápido, mas ela diz que os
gerentes e os trabalhadores têm mais respeito mútuo e trabalham juntos
de forma harmônica.
No departamento de pintura, onde ela trabalha, as pessoas costumavam
fazer a mesma tarefa durante o dia todo, mas agora se alternam em várias
atividades para evitar desgaste físico e tédio. Os trabalhadores são
encorajados a corrigir algumas pequenas falhas no acabamento eles
mesmos, em vez de repassá-las para outro departamento.
Algumas peças que antes eram produzidas na fábrica, como abraçadeiras e
parafusos, vêm de fornecedores externos. A produção varia, dependendo
das vendas a cada dia, por isso a empresa não tem que manter grandes
estoques bem à frente do período de pico das vendas, na primavera - ou
adivinhar que modelos e cores serão populares.
Mudanças semelhantes estão sendo adotadas por fábricas da Harley em
Kansas City, Missouri, e na região de Milwaukee. Ao todo, a
reestruturação vai reduzir os custos da empresa este ano em pelo menos
US$ 275 milhões, segundo estimativas da Harley.
Robôs agora fazem a maior parte da soldagem e corte de metais. Mas a
automação tem seus limites. Funcionários de carne e ossos ainda fazem o
controle de qualidade e o trabalho de montagem.
Por James R. Hagerty/The Wall Street Journal/Valor Econômico